Base Conceitual do Artesanato: desafios e facilidades

Portaria 1007-SEI/2018, Base conceitual do artesanato brasileiro

AUTORIA: Ari Rodrigues

O Projeto Estruturação do Sistema de Gestão do Artesanato Brasileiro: Diagnóstico e Planejamento Estratégico ofertou o curso de extensão no formato remoto, denominado Políticas Públicas e Desenvolvimento do Artesanato. A capacitação compõe o diagnóstico nacional da atividade e fundamenta-se no levantamento participativo dos dados, na troca de saberes entre os sujeitos protagonistas do setor e no fortalecimento da rede com foco na implementação de políticas públicas.

Destinada aos representantes nacionais e estaduais do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB), do Sebrae e das Confederações e Federações de Artesãos, a estrutura curricular compreendeu aulas síncronas, assíncronas e revisões bibliográficas de temas com perspectivas interdisciplinares, distribuídos em dez módulos e ministrados durante cinco semanas, entre agosto e setembro de 2021. A base conceitual foi a temática inicial.

Desse modo, o blog do projeto será uma ferramenta para compartilhar os conteúdos abordados no curso para o público geral, de forma a ampliar os conhecimentos sobre o artesanato brasileiro. O primeiro módulo foi ministrado por Maria Dorotéa de Aguiar Barros Naddeo e teve a seguinte ementa:

Principais conceitos definidos na Portaria 1.007-SEI/2018 (artesanato, artesão, classificação da produção artesanal, categorias dos produtos artesanais, formas de organização da produção artesanal, tipologias do artesanato e técnicas de produção artesanal) e seu impacto na formulação de políticas públicas do artesanato.

O que é a base conceitual

Em 01 de agosto de 2018, a Secretaria Especial da Micro e Pequena Empresa, do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, publicou no Diário Oficial da União (DOU), seção 1, página 34, a Portaria nº 1007. O documento institui o Programa do Artesanato Brasileiro (PAB), cria a Comissão Nacional do Artesanato e dispõe sobre a base conceitual. 

Neste sentido, a legislação define os conceitos de artesão, mestre e artista popular; determina o que é considerado artesanato, classificando-o conforme a origem e a finalidade; dispõe sobre a Carteira Nacional do Artesão e, nos anexos, enumera o rol de categorias, de acordo com a matéria-prima utilizada, e o rol de técnicas artesanais.

Segundo o Art. 1º, a base conceitual é utilizada para padronizar e estabelecer os parâmetros de atuação do PAB em todo o território nacional, e subsidiar o Sistema de Informações Cadastrais do Artesanato Brasileiro (SICAB), em parceria com as Coordenações Estaduais do Artesanato. Logo, as informações geradas pelo SICAB, em conjunto com a base conceitual, contribuirão para a definição de políticas públicas e o planejamento de ações de fomento para o setor artesanal brasileiro.

A legislação é aplicável em todo o território nacional, incluindo todos os artesãos e unidades produtivas artesanais que pretendam ser reconhecidos como tais, sem prejuízo das eventuais adaptações às especificidades regionais, conforme definido no Art. 2º.

Programa do Artesanato Brasileiro (PAB)

O órgão responsável pela implementação de políticas públicas do artesanato é o Programa do Artesanato Brasileiro (PAB). Criado em 1991, é atualmente vinculado à Subsecretaria de Desenvolvimento das Micro e Pequenas Empresas, Empreendedorismo e Artesanato da Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação, do Ministério da Economia. 

A portaria 1007 aborda o PAB no capítulo II. O Art. 3º determina que sua composição compreende uma Coordenação Nacional e 27 Coordenações Estaduais do Artesanato (CEA). São atribuições das CEA: cadastramento, atualização dos dados, emissão da Carteira Nacional do Artesão, seleção de artesãos e demais diretrizes. Outrossim, o Art. 4º institui o objetivo central da instituição: promover o desenvolvimento integrado do setor artesanal e a valorização do artesão, elevando o seu nível cultural, profissional, social e econômico. 

Entre suas finalidades, estão: reconhecer e fortalecer a profissão do artesão/artesã; prestar apoio estratégico e permanente mediante promoção de qualificação profissional; fomentar, apoiar e fortalecer a atividade e a cadeia produtiva do artesanato; articular as ações públicas voltadas para o desenvolvimento da atividade; implantar e consolidar canais públicos de comercialização dos produtos artesanais; promover e divulgar o artesanato como expressão da diversidade cultural brasileira.

A atuação do PAB está pautada em quatro eixos centrais, segundo o Art. 7º: Fortalecimento do Artesão e do Artesanato Brasileiro, Acesso a mercado, Sistema de Informações Cadastrais do Artesanato Brasileiro (SICAB) e Qualificação e formação do artesão.

Conceito de artesão

Segundo a definição oficial, artesão é toda pessoa física que, de forma individual ou coletiva, faz uso de uma ou mais técnicas no exercício de um ofício predominantemente manual, por meio do domínio integral de processos e técnicas (capacidade de realização do processo produtivo completo concernente à criação do produto artesanal), transformando matéria-prima em produto acabado que expresse identidades culturais brasileiras.

O parágrafo segundo do Art. 8º delibera que o artesão poderá utilizar artefatos, ferramentas, máquinas e utensílios para auxílio limitado, desde que seu manuseio exija ação permanente do artesão para executar o trabalho; moldes e matrizes, não comercializáveis, desde que tenham sido criados e confeccionados pelo próprio artesão para o seu uso exclusivo.

Além disso, mestre é estabelecido como aquele artesão que se notabilizou em seu ofício, legitimado pela comunidade que representa e que difunde para as novas gerações conhecimentos acerca dos processos e técnicas do ofício artesanal. Enquanto artista popular é o artesão autodidata, que cria, de forma espontânea, obras autorais únicas, atemporais, de relevante valor histórico e/ou, artístico e/ou cultural, que retratam o imaginário popular.

A base conceitual apresenta, ainda, aspectos que classificam quem não é considerado artesão, como é o caso daqueles que trabalham de forma industrial, com o predomínio da máquina e da divisão do trabalho, do trabalho assalariado e da produção em série industrial; somente realizam um trabalho manual, sem transformação da matéria-prima e fundamentalmente sem desenho próprio, sem qualidade na produção e no acabamento; realizam somente uma parte do processo da produção, desconhecendo o restante.

Carteira Nacional do Artesão

O acesso às políticas públicas do artesanato ocorre a partir do cadastro do artesão no SICAB. As categorias de registro são: artesão profissional, mestre artesão profissional, associação de artesãos, cooperativa de artesão, grupo de produção artesanal, sindicato de artesão, federação de artesão e confederação de artesão. 

A Carteira Nacional do Artesão é um documento físico, válido em todo o território nacional, que identifica o profissional artesão. A emissão é realizada pelas Coordenações Estaduais de Artesanato (CEA), após o cumprimento de alguns requisitos, a apresentação de documentos e a submissão de uma peça artesanal para o teste de habilidade. O documento tem validade de 6 anos e possibilita obtenção de inúmeros benefícios, como participação em feiras de artesanato, cursos e oficinas, facilidade de acesso ao microcrédito e incentivos fiscais em alguns estados da federação.

carteira nacional do artesão

Representações de Carteiras do Artesão. Reprodução: Sedetur/Alagoas.

Conceito de artesanato

O quarto capítulo da Portaria 1007-SEI/2018 estabelece o artesanato como toda produção resultante da transformação de matérias-primas em estado natural ou manufaturada, através do emprego de técnicas de produção artesanal, que expresse criatividade, identidade cultural, habilidade e qualidade. Em adição, aceita-se produtos artesanais com referências a culturas estrangeiras, desde que tenham sido assimiladas por localidades com tradição imigratória.

No entanto, pelo parágrafo 6º do Art. 19º, não é considerado artesanato: trabalho realizado a partir de simples montagem, com peças industrializadas e/ou produzidas por outras pessoas; lapidação de pedras preciosas; fabricação de sabonetes, perfumarias e sais de banho; habilidades aprendidas através de revistas, livros, programas de TV, dentre outros, sem identidade cultural; uso de moldes e padrões de terceiros; produção assistemática nem cópias, sem valor cultural que identifique sua região de origem ou o artesão que o produziu.

Ademais, a produção artesanal é classificada em seis categorias: Artesanato Tradicional (transferência de conhecimentos de técnicas), Arte Popular (trabalho individual do artista popular que expressa aspectos identitários), Artesanato Indígena, Artesanato Quilombola, Artesanato de Referência Cultural (resgate ou releitura de elementos culturais tradicionais nacionais ou estrangeiros assimilados) e Artesanato Contemporâneo-Conceitual (produção com predominância urbana que incorpora elementos criativos e resgata técnicas tradicionais).

Artesanato indígena

Artesanato indígena: cocar da etnia Kayapó (PA). Acervo do Museu de Arte Indígena.

No Art. 21º, o artesanato é categorizado em função de sua finalidade: adornos, acessórios e vestuários: objetos de enfeite de uso pessoal com função estética; decorativos; educativos; lúdicos (os produtos destinados ao público infantil deverão observar a legislação específica vigente); religiosos/místicos; profanos; utilitários; lembranças/souvenirs.

Rol de tipologias

No Anexo I, são dispostas as tipologias do artesanato de acordo com a origem da matéria-prima. 

  • Matéria-prima natural: insumos de origem animal, vegetal e mineral utilizados em seu estado bruto, bem como aqueles submetidos a processos simplificados de beneficiamento.
  • Matéria-prima manufaturada: elementos de origem animal, vegetal e mineral transformados por processos de beneficiamento de maior complexidade, em geral, mecanizados.
  • Matéria-prima sintética: materiais desenvolvidos de modo artificial, pela síntese de componentes naturais e químicos.

Tabela das tipologias do artesanato com matérias-primas naturais. Elaboração de Maria Dorotéa de A. B. Naddeo.

 

Tabelas das tipologias do artesanato com matérias-primas manufaturadas e sintéticas. Elaboração de Maria Dorotéa de A. B. Naddeo.

Rol de técnicas artesanais

No Anexo IIda Portaria 1007 estão listadas as técnicas artesanais, com respectivos conceitos.

Lista das técnicas artesanais dispostas na base conceitual - primeira parte

Lista das técnicas artesanais – primeira parte. Elaboração de Maria Dorotéa de A. B. Naddeo.

 
Lista das técnicas artesanais dispostas na base conceitual - segunda parte

Lista das técnicas artesanais – segunda parte. Elaboração de Maria Dorotéa de A. B. Naddeo. Elaboração de Maria Dorotéa.

 
Lista das técnicas artesanais dispostas na base conceitual - primeira final

Lista das técnicas artesanais – parte final. Elaboração de Maria Dorotéa de A. B. Naddeo. Elaboração de Maria Dorotéa.

São dispostas três técnicas complementares: reutilização (aproveitamento de um material sem transformar sua estrutura ou composição química), tingimento (alteração da cor primitiva de tecidos, fios, fibras, vegetais, couro ou outros materiais) e  prensamento (dar conformidade a materiais submetidos a uma pressão uniforme em toda a sua superfície), que só podem ser cadastradas se estiverem associadas a uma das técnicas do rol de técnicas principais, não podendo, de forma alguma, ser considerada como técnica de produção artesanal. Autoriza-se, ainda, a execução da técnica serigrafia para povos indígenas, desde que, seja feita de forma mecânica, onde o desenho seja feito à mão livre, de autoria do artesão, à confecção da tela e impressão no suporte.

As opiniões emitidas nesta publicação são de exclusiva e de inteira responsabilidade do autor, não exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do Ministério da Economia e do Programa do Artesanato Brasileiro.

Referências

Apresentação elaborada por Maria Dorotéa de Aguiar Barros Naddeo.

IMPRENSA NACIONAL. PORTARIA Nº 1.007-SEI, DE 11 DE JUNHO DE 2018 – Imprensa Nacional. Disponível em: <https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/34932949/do1-2018-08-01-portaria-n-1-007-sei-de-11-de-junho-de-2018-34932930>.‌

 

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